Portugal recebeu a notícia dos primeiros casos positivos de COVID-19 há pouco mais de oito dias, mas os efeitos diretos e indiretos na restauração, hotelaria e turismo não tardaram. Menos reservas, muitos cancelamentos, e redução da procura marcam agora o dia-a-dia de restaurantes, hotéis, empresas de animação turística e de muitos negócios que vivem do turismo, um pouco por todo o país.

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Há 26 anos no ramo, o chef Rui Paula que, no passado mês de novembro, recebeu a segunda estrela Michelin pelo restaurante Casa de Chá da Boa Nova, em Leça da Palmeira, manifestou hoje a sua tristeza e apreensão ao revelar, via Facebook, que os seus espaços de restauração contam já com uma quebra de 60% na faturação devido ao surto de Covid-19, que atingiu o país no passado dia 3 de março, mas que já provocava uma redução de visitantes internacionais desde o início do ano.

Pouco otimista com a situação para os próximos meses, Rui Paula apelou à união de todos os que atuam na restauração, hotelaria e turismo, para que pressionem o Governo a definir políticas públicas que evitem o encerramento de muitos destes negócios. “Se não forem tomadas medidas drásticas e de rápida implementação, metade dos estabelecimentos hoteleiros/restauração de Portugal fechará as suas portas”, pode ler-se na página do chef.

“As empresas necessitam de estar minimamente saudáveis aquando da implementação dessas medidas, e não já na fase de prejuízo, se não a recuperação após Covid-19 será de extrema dificuldade”, reforça Rui Paula.

Ljubomir Stanisic, outro chef bem conhecido dos portugueses pela sua participação no programa da TVI, ‘O Pesadelo na Cozinha’,  e proprietário do restaurante 100 Maneiras, em Lisboa, manifestou opinião semelhante. Na sua página de facebook, o chef escreveu: “numa fase terrivelmente difícil para todos, pedimos a todos os membros da indústria que se unam para que, em conjunto com os responsáveis pelo nosso país, se possam desenvolver soluções que ajudem as empresas a sobreviver a esta pandemia”.

Apesar das quebras que enfrenta no seu negócio, Ljubomir mantém-se otimista e explica que reforçou a aposta na higiene e segurança alimentar – “uma prioridade nos nossos espaços”, refere – seguindo os protocolos de higienização que esta situação exige. O recurso aos stocks para diminuir a frequência de encomendas, o aumento da disponibilidade de produtos de desinfeção, e uma atenção redobrada à saúde dos colaboradores são algumas das medidas que adotou. Fica também a mensagem para todos, clientes e profissionais do setor: “lembrem-se que a união faz mesmo a força. Vamos enfrentar este “boi” pelos cornos!

Ljubomir Stanisic encerra restaurantes devido ao COVID-19

Perdas de 800 milhões em dois meses

A confirmar a apreensão de Rui Paula, a Associação da Hotelaria de Portugal (AHP) anunciou hoje uma estimativa de perda de receitas na ordem dos 50% devido ao novo coronavírus. Para Cristina Siza Vieira, secretária-geral da associação, esta quebra poderá ascender aos 800 milhões de euros até junho, tendo em conta um cenário de maior gravidade. Contudo, mesmo que a situação não seja assim tão negativa, a estimativa de quebra não será inferior a 500 milhões para o mesmo período.

Apesar disso, a expectativa dos hoteleiros nacionais, segundo um inquérito realizado pela AHP junto dos seus associados, é que o turismo recupere dos estragos provocados pelo COVID-19 a partir de meados do ano, permitindo alguma recuperação do setor durante o período do verão.

Antes do dia 3 de março, altura em que Portugal reportou o primeiro caso de Covid-19, os cancelamentos – até aí apenas 25% dos associados da AHP reportavam cancelamentos acima dos 10% – não eram expressivos. No entanto, dois dias depois, 36% do mesmo grupo de profissionais revelava quebras superiores a 10%. Já no dia 9 de março, os números tinham crescido de forma exponencial, com 41% dos inquiridos pela AHP a admitir uma redução de reservas superior a 10%.

Também o presidente da AHP, Raúl Martins, CEO do Grupo Altis, acredita que a hotelaria poderá apresentar quebras na ordem dos 20% no final de 2020.

Estas perdas, transversais a todo o setor, complicarão a tesouraria das empresas e colocarão em risco milhares de postos de trabalho. A AHP defende, por isso, a intervenção do Governo no sentido de promover medidas de apoio que possam ajudar os empresários a lidar com a situação, sem terem que dispensar a sua força de trabalho ou, no limite, fechar portas. Esta será, de acordo com os agentes do setor, uma das formas de minimizar o impacto do COVID-19 no turismo.

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Prevenir para não remediar

A fechar portas, mas apenas por prevenção, estão os restaurantes e lojas do grupo Amorim Luxury. Em comunicado, o grupo acaba de anunciar que, a partir de amanhã, dia 13 de março, os seus restaurantes JNcQUOI Avenida, JNcQUOI ASIA, Ladurée, o JNcQUOI CLUB, bem como as suas lojas Fashion Clinic e Gucci situadas em Lisboa, no Porto e no Algarve. Foi também adiada a abertura da nova loja Dolce & Gabbana situada na Avenida da Liberdade, em Lisboa. A reabertura de todos os espaços fica condicionada à reavaliação e acompanhamento permanente da evolução da pandemia refere a empresa.

No que diz respeito aos espaços culturais dos grandes centros urbanos, Lisboa já encerrou todos os espaços com gestão camarária e o Porto seguiu o mesmo caminho, fechando teatros e outros equipamentos. As medidas foram tomadas numa altura em que a Organização Mundial de Saúde já declarou o vírus como pandemia, aumentando as restrições nos países mais afetados como Itália e condicionando as viagens – as companhias aéreas estão, também, a adaptar-se à nova realidade.